segunda-feira, 3 de maio de 2010

Petição Inicial do Presidente da Junta - Subturma 3

Processo nº 00374810
Secção...
Acção administrativa especial

Exmo Senhor Juíz de Direito

Nereu Salgado, Presidente da Junta de Freguesia de Águas Escuras, cuja sede da Junta de Freguesia se situa na Rua Verde nº 17890-001, sita na freguesia de Águas Escuras, Concelho de Vila Pouca de Alarico,

vem, pela legitimidade conferida pelo art. 2º/2 da LAP e art. 46º/2 CPTA, intentar a presente acção administrativa especial na modalidade de impugnação de acto administrativo, nos termos dos arts. 46º e 51º e seguintes do CPTA, a interpor contra

o Presidente da Câmara Municipa de Vila Pouca de Alarico, Abílio Verdíssimo, residente na Rua dos Telefones, cuja sede se situa na Quinta do Tempo, concelho de Vila Pouca de Alarico

e

João Sebastião Ribeiro & Filhos S.A., pessoa colectiva 59070598, com sede na Rua Padre Francisco José de Assis, nº 10, Rio de Janeiro, Brasil.


Deste modo, vem pedir-se a declaração de nulidade de acto admnistrativo - a resolução do Conselho de Ministros que dispensa o procedimento de Avaliação de Impacto Ambiental,

e, consequentemente,

a anulação dos actos administrativos posteriormente praticados pelo Presidente da Câmara de Vila Pouca de Alarico, mais concretamente, o alvará nº 54961 que viria a autorizar o início das obras de instalação da ETAR, nos termos dos arts. 50º/1, 51º/1 e, ainda, do art. 136º/2 do CPA e com base no art. 135º do CPA referente aos actos anuláveis,

o que faz com os seguintes fundamentos:

I- Dos Factos:

1. A multinacional brasileira João Sebastião Ribeiro, S.A., especializada no tratamento de águas residuais apresentou, na Câmara Municipal de Vila Pouca de Alarico, um projecto de tratamento de águas residuais no lugar de Águas Escuras.

2. O projecto consiste na instalação de uma Estação de Tratamento de Águas Residuais destinada a servir a população de Vila Pouca de Alarico, município com cerca de 65000 habitantes.

3. No início orientada apenas para o centro urbano da vila, a curto prazo a JSR & Filhos, S.A. pretende expandir a sua actividade de forma a abrager também os mais de 50000 lares dos concelhos vizinhos.

4. Abílio Verdíssimo, Presidente da Câmara Municipal de Vila Pouca de Alarico é um entusiasta do projecto por considerar que vai trazer não só emprego, como também investimento estrangeiro no valor de cerca de 100 milhões de euros ao município, para além de vir a contribuir para um aumento da qualidade da protecção ambiental da região.

5. Mas não só: pretende que a unidade venha a ser alimentada energeticamente, em parte, com recurso a painéis solares e a uma pequena centra de biomassa privada.

6. Decorreram negociações informais entre a JSR & Filhos, S.A. e o Presidente da Câmara.

7. Com base nessas negociações foi apresentado ao Governo um pedido para que o projecto fosse considerado PIN+ e dispensado de Avaliação de Impacto Ambiental - AIA.

8. Passados 4 meses o Governo aprovou, através de resolução de Conselho de Ministros, a dispena de AIA.

9. Foin apresentado como fundamento apara a dispensa "o profundo interesse nacional em causa e a necessidade de Portugal aumentar a qualidade do tratamento de águas residuais nos municípios do interior".

10. Dois dias após a publicação da dita resolução, o Presidente da Câmara Muncipal de Vila Pouca de Alarico emitiu um alvará para início das obras de instalação da ETAR.

11. A associação ambientalista local "Amigos das Águas Escuras" está indignada com a localização da ETAR.

12. Invoca que o terreno se encontra dentro da área da Paisagem Protegida da Ribeira do Magano e que, por isso, o Princípio da Precaução implica que a Administração não autorize a construção da central.

13. Jorge Neptuno, dono de alguns terrenos perto de Águas Escuras, queixa-se de não ter tido oportunidade de se pronunciar sobre a construção da ETAR e de, hoje em dia, ninguém lhe facultar acesso às respectivas plantas.

14. Em relação a Nereu Salgado, demonstrou desconfiança em relação ao licenciamento.

15. Alguma coisa não lhe parecia bem neste licenciamento e entendia não haver razão para dispensar o procedimento de AIA.

16. O Estudo de Impacto Ambiental - EIA - vem determinar os impactes ambientais e Águas Escuras é uma região fortemente predominada pela agricultura pelo que vai determinar alguns inconvenientes à construção da ETAR.

17. Este estudo vai determinar que uma parte da população de Águas Escuras vai ver a sua actividade reduzida por falta de campos para plantação.

18. Também irá haver uma diminuição de das exportações de frutos e legumes para Espanha uma vez que a maior parte da exportação para este país é feita por frutos e legumes detsa zona de Portugal.

19. Para além disso, vai haver uma redução do oxigénio produzido naquela zona, uma vez que vão ter de ser destruídos campos agrícolas com a plantação de árvores.

20. Irá pôr-se em risco a o desaparecimento de algumas espécies de flores que crescem somente nos campos de Águas Escuras.

21. Mais do que isso, é necessário provar que a empreitada em questão não porá em risco a paisagem da Ribeira do Magano, o que não se acredita.

22. Repare-se que sequer o projecto e o EIA foram disponibilizados diante do pedido de dispensa. Ora, não houve, durante o procedimento, qualquer preocupação em se analisar os prejuízos certamente gerados pela instalação da ETAR.

II- Do Direito

23. O procedimento ora atacado, impregnado de vícios formais, vai, ainda, totalmente contra os ditames constitucionais e comunitários de protecção do Ambiente.

24. Mais do que isso, a Constituição da República Portguesa, no seu art. 66º/1, eleva esta protecção ao nível de Direito Fundamental, implicando uma valoração.

25. Ocorre que, diante da postura do Estado no caso em epígrafe, não se observou o exercício da dimensão objectica do Direito Fundamental ao Ambiente. O Estado, com o procedimento realizado, não adoptou medidas que visassem a conservação da Natureza, o equilíbrio biológico e a estabilidade dos diferentes habitats, nomeadamente através da constituição de áreas protegidas (art. 4º/e) da Lei de Bases do Ambiente). Muito ao revés, foi omisso, demonstrando uma absoluta desvalorização deste Direito Fundamental, situação totalmente vedada a nível constitucional.

26. O que não se entende é o facto, independentemente de qualquer interesse económico, sendo o caso de uma região legalmente protegida e preservada, de o Governo fechar os olhos para uma das principais questões do tempo de hoje: a Protecção do Ambiente, função sua diante da dimensão objectiva deste Direito Fundamental, ferindo de morte princípiosn basilares deste direito, como o da Prevenção e o do Desenvolvimento Sustentável.

27. Conforme resulta do art. 2º/e) do DL 69/2000 de 3 de Maio é o "instrumento de carácter preventivo da política do Ambiente, sustentado da realização de estudos e consultas, com a efectiva participação pública e análise de possíveis alternativas, que tem por objecto a recolha de informação, identificação e previsão dos efeitos ambientais de determinados projectos, bem como a identificação e proposta de medidas que evitem, minimizem ou compensem esses efeitos, tendo em vista uma decisão sobre a viabilidade de execução de tais projectos e respectiva pós avaliação".

28. Esta AIA constitui um instituto de carácter preventivo de política ambiental que se destina a verificar as consequências ecológicas de um determinado projecto, levando à ponderação de vantagens e inconvenientes, em termos de repercussão ambiental, pelo que a sua dispensa só é justificada perante circunstâncias excepcionais e devidamente fundamentadas.

29. A AIA é, então, um meio jurídico ao serviço da realização dos fins ambientais, em especial para a obtenção para o Princípio da Precaução, uma vez que ele permite evitar/acautelar possíveis lesões futuras do meio ambiente em momento prévio ao da acção administrativa necessária.

30. Isto acaba por "alertar" as autoridades administrativas dos riscos ambientais do projecto em causa, os quais irão ser considerados nas decisões.

31. No presente caso, não deveria ter sido dispensada a AIA uma vez que não estamos perante circuntâncias excepcionais que possam fundamentar a ausência desta avaliação (art. 3º/1 DL 69/2000), uma vez que os interesses ambientais que poderão ser postos em causa pela presente obra reclamam a existêncian de uma AIA que aqverigua as repercussões ecológicas da construção da ETAR.

32. O Presidente deveria ter apresentado o EIA juntamente com o requerimento de dispensa de AIA a fim de permitir que a Administração, posteriormente, esteja em melhores condições de tomar uma decisão correcta acerca da presente questão, nomeadmante com melhores condições de avaliar o Impacto AMbiental da obra em causa.

33. O EIA é, nos termos do art. 2º/1 do DL 69/2000 o"documento elaborado pelo proponente no âmbito do procedimento de AIA, que contém uma descrição sumária do projecto, a identificação e e avaliação dos impactes prováveis, positivos e negativos, que a realização do projecto poderá ter no Ambiente, a evolução previsível da situação de facto sem a realização do projecto, as medidas de gestão ambiental destinadas a evitar, minimizar ou compensar os impactes negativos esperados e um resumo não técnico destas informações."

34. Verifica-se que o pedido de dispensa de procedimento de AIA deveria ter sido decidido pelo Ministro Responsável pela Área do Ambiente e pelo Ministro da Tutela (art. 3º/7 DL 69/2000) e não pelo Conselho de Ministros, pelo que se verifica uma nulidade da dispensa.

35. Tendo havido deferimento do pedido de dispensa, este deveria ser acompanhado das medidas que deverão, em princípio, ser impostas no licenciamento ou na autorização do projecto com vista a minimização dos impactes ambientais considerados relevantes, por força do art. 3º/7 do DL 69/2000.

36. Estão sujeitos a AIA os projectos enunciados no anexo II e outros (art. 1º/e DL 69/2000). No caso em concreto, por ser a situação prevista no ponto 11, d) do anexo II, pelo que a ETAR é igual ou inferior a 100000 hab./eq verificando-se uma situação de impacte relevante, o que significa que este projecto estava sujeito a AIA, nos termos do art. 1º/3b) do DL 69/2000.

37. O pedido de dispensa deve ser dirigido à autoridade licenciadora, no caso a CÂmara de Vila Pouca de Alarico. Além disso, ao que tudo indica, o pedido de dispensa foi feito sem apresentação de projecto e de EIA, impedindo uma análise detida das questões ambientais relevantes a serem afectadas. Ou seja, a questão ambiental foi totalmente desprezada.

38. Ao que tudo indica, não houve remessa à autoridade de AIA para efectuar parecer.

39. O prazo não foi respeitado, conforme o nº 10 do art. 3º, o que geraria o indeferimento da pretensão.

40. Para além do mais, parece, o caso em análise configurar numa situação de "alteração da instalação", regime previsto no art. 10º do DL 173/2008 de 26 de Agosto, uma vez que está prevista a "expansão futura da instalação" para que possa também "abranger um aterro de resíduos urbanos com uma capacidade de de cerca de 25000 toneladas."

41. Implica isto que se siga o procedimento previsto neste artigo deste DL e que, no caso presente, significa que o Operador - a JSR & Filhos S.A. - deverá desencadear o pedido de licença ambiental nos termos do art. 11º e ss para a hipótese de a Agência Portuguesa do Ambiente - APA - entender que se trata de uma alteração substancial da instalação.

42. Se considerar que se trata de alteração substancial da instalação comunica à Entidade Coodenadora - EC - a necessidade de o Operador desencadear o pedido de licença ambiental nos termos previstos no DL, segundo o art. 10º/2.

43. Caso contrário, a APA, se necessário, adita à licença a alteração proposta pelo Operador dando conhecimento à EC no prazo de 30 dias, à luz do art. 10º/3.

44. Cabe, portanto, densificar o conceito de "alteração substancial da instalação". Para isso, o art. 2º/b) do DL estabelece 2 níveis:

- No primeiro, são abrangidas modificações e ampliações de uma instalação que sejam susceptíveis de produzir efeitos nocivos e significativos nas pessoas ou no Ambiente.
- Num segundo nível, dispõe que são alterações substanciais de uma instalação os casos cuja ampliação corresponda aos limiares estabelecidos no anexo I.

45. No caso em análise, a alteração substancial implica a expansão futura de um aterro de resíduos urbanos com capacidade de cerca de 25000 toneladas pelo que se enquadra neste segundo nível enunciado, mais concretamente no ponto 5.4 no anexo I.

46. Conclui-se, então, que se está na presença de uma alteração substancial, sendo aplicável o regime do art. 10º/2 referente "alterações de instalação".

47. Sendo assim, a APA deve comunicar à EC a necessidade de o Operador desencadear o pedido de licença ambiental nos termos do art. 11º e ss.

48 Ora, o Operador não desencadeou o respectivo procedimento ao abrigo dos artigos enunciados, pelo que a expansão futura do aterro de resíduos urbanos não dispõe de licenciamento ambiental.

49. Como tal, entende-se que não está devidamente assegurada a tutela dos interesses dos cidadãos de Águas Escuras visto que o projecto em causa não apresenta garantias que os prptejam, designadamente atendendo a questões de saúde pública, envolvência paisagística, eventual perturbação de pssoas e/ou ecossistemas que possam existir na árera.

50. Assim sendo, o Presidente da Câmara de emitiu alvará sem que existisse licenciamento ambiental do projecto.

51. Um alvará e um documento legal emitido por uma autoridade municipal após avaliação técnica de um projecto, que comporova o licenciamento para a execução da obra.

52. De acordo com a argumentação deduzida, entende-se que o projecto em causa, que envolve a construção da ETAR e consequente expansão futura da instalação de forma a abrager também um aterro de resíduos urbanos com uma capacidade de cerca de 25000 toneladas, não obteve o devido licenciamento ambiental, conforme o exposto.

53. Como tal, o alvará para construção não deveria ter sido emitido pelo Presidente da Câmara municipal sem que este procedimento - o pedido de licenciamento ambiental - tivesse sido desencadeado primeiro.

54. Logo, deverá o alvará de construção ser considerado anulável nos termos do art. 135º do CPA, donde se parte para a impugnação perante os tribunais nos termos do art. 136º/2 do CPA através da presente Petição.

Nestes termos e nos mais de Direito, e com o mui douto suprimento de V. Exa, deve a presente acção ser considerada procedente por se considerarem verificados os vícios mencionados supra e, em consequência:

- Ser anulado o alvará de construção emitido;
- Ser declarada nula a resolução do Conselho de Ministros;
- Haver condenação dos Réus no pagamentos das custas.


Valor: Indeterminável, art. 34º/1 CPTA
Junta: Procuração Forense.


Os Advogados
Alexandra Guerra
Carla André
Pedro Pontes

Águas Escuras, 3 de Maio de 2010

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