segunda-feira, 3 de maio de 2010

Petição Inicial da Associação (Subturma 3)


Exmo. Sr. Juiz de Direito do
Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela

A associação AMIGOS DAS ÁGUAS ESCURAS, pessoa colectiva de direito privado portadora do NPC 503.564.536, com sede em Rua das Fontaínhas, Lote 3, 2345-453 Vila Pouca de Alarico, representada por Albertina Pinheiro (nº 1 do art. 3º do respectivo estatuto, publicado em Diário da República II Série de 24-03-2003), residente em Rua das Camélias nº5, 2345-463 Vila Pouca de Alarico,

Vem, nos termos da al. a) do nº2 do art.46º do CPTA, intentar a presente

ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL
Na modalidade de acção de impugnação de acto administrativo
A interpor contra

• MUNICÍPIO DE VILA POUCA DE ALARICO, com sede em Calçada das Águas Livres, Lote 107, 2780-334 Vila Pouca de Alarico, representado pelo Presidente da Câmara João Suja Águas (68º/1 a) LAL);

• JOÃO SEBASTIÃO RIBEIRO & FILHOS S.A., pessoa colectiva nº 503.658.354, com sede em Av. da Praia nº104, Porto de Galinhas, Brasil, representado por João Sebastião Ribeiro Júnior, com residência ocasional na Rua dos Pintainhos, nº3 R/C Dto., 2346-192 Capoeira.

VISANDO:
A. A anulação da emissão do alvará nº 13/10, emitido pelo Presidente da Câmara Municipal de Vila Pouca de Alarico no âmbito do processo 345, que consiste na aprovação do início das obras de instalação da ETAR de Águas Escuras.

O que faz nos termos e com os fundamentos seguintes:

I - DOS FACTOS


No dia 4 de Janeiro de 2010, a sociedade multinacional brasileira João Sebastião Ribeiro & Filhos S.A. apresentou à Câmara Municipal de Vila Pouca de Alarico um projecto de construção de uma Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) em Águas Escuras.


O artigo predial no qual se pretende construir a ETAR localiza-se na área da Paisagem Protegida da Ribeira do Magano, criada pelo Decreto-Lei 35/2000 de 18 de Setembro, nos termos do art.3º do referido diploma.


No dia 20 de Janeiro de 2010, o referido projecto foi enviado ao Governo para que este o considerasse PIN + e o dispensasse de Avaliação de Impacto Ambiental.


Dois meses decorridos, o Governo, através da resolução de Conselho de Ministros nº 253/10, dispensou o projecto de Avaliação de Impacto Ambiental, fundamentando com base no “profundo interesse nacional em causa e na necessidade de Portugal aumentar a qualidade do tratamento de águas residuais nos municípios do interior”.


A 26 de Março de 2010, o Presidente da Câmara Municipal de Vila Pouca de Alarico emitiu o alvará nº13/10, que aprovava o início das obras de instalação da referida ETAR.


No dia 28 de Abril de 2010, a Autora, Organização Ambientalista Não Governamental que visa a protecção e conservação dos recursos naturais da Freguesia de Águas Escuras, nos termos do nº1 do art. 2º e alínea c do art. 10º da Lei 35/98 de 18 de Julho e do art. 1º do seu estatuto, tomou conhecimento do referido alvará, através do edital nº 50.

II – DO DIREITO


O Decreto Regulamentar 35/2008, de 26 de Fevereiro, criou a Paisagem Protegida de Ribeira do Magano, dada a manifesta excepcionalidade do interesse ecológico regional da área em questão.


No art. 3º do referido diploma, estabelecem-se os seguintes limites geográficos da paisagem protegida:
1) Do desvio da estrada florestal na encosta das Esquinas, pela linha de água nascente da ribeira do Magano, em direcção a jusante até à confluência da barroca de Degrainhos; desta confluência, segundo a inflexão da linha de água em linha recta na direcção E.-W., até ao carreteiro que, partindo da povoação de Visigodo, segue a linha de festo da Lomba do Alarico na direcção N.-S.; pelo referido carreteiro até ao caminho de pé posto que estabelece a ligação entre esse mesmo carreteiro e o ponto de confluência das linhas de água da barroca do Pardal e da barroca do Entrudo; desta última confluência, pela barroca do Entrudo em direcção sul, até ao marco geodésico (Picoto) cota 1018, e do marco geodésico, seguindo a estrada florestal em direcção este, até ao desvio da estrada florestal na encosta das Esquinas;


Ora, o artigo matricial (inscrição nº 476 do Registo Predial) destinado à instalação da ETAR encontra-se situado precisamente dentro do perímetro da Paisagem Protegida.

10º
Sendo assim, cumpre aplicar o regime jurídico que resulta do referido decreto regulamentar.

11º
De acordo com o art. 9º, existe, dentro da área protegida, uma Zona de Protecção Especial, que é definida pelos dados geográficos referidos no nº2 do mesmo artigo.

12º
Verifica-se que o terreno está situado nesta Zona de Protecção Especial, sendo de aplicar o seu regime específico, definido no nº 4 do mesmo artigo, que estipula,

13º
Na Zona de Protecção Especial, a implementação de projectos que envolvam a instalação de estações de tratamento de águas residuais de capacidade superior a 60 000 hab/eq fica sujeita ao critério da inevitabilidade.

14º
De acordo com os nº 5 do art. 9º, o critério da inevitabilidade assenta na imprescindibilidade da infra-estrutura para a satisfação dos interesses da comunidade local.

15º
A apreciação da verificação do requisito da inevitabilidade constitui, assim, o ponto principal do presente articulado. Cumpre então proceder a uma interpretação pormenorizada da disposição, com recurso a adequados elementos interpretativos.

16º
Não é aqui de qualquer utilidade o elemento literal, já que se trata de um conceito indeterminado, que implica uma margem de livre apreciação por parte da autoridade licenciadora do projecto.

17º
Para concretizar o conceito é necessário utilizar a teleologia da norma e o princípio da precaução, entendido aqui como uma ideia de prevenção agravada ou mais exigente, e decorrente do nº2 do art. 174º do Tratado das Comunidades Europeias.

18º
A criação da Paisagem Protegida da Ribeira do Magano teve como escopo, como é característico dos regimes que estabelecem áreas protegidas (em desenvolvimento do estabelecido no art. 19º do Decreto-lei 142/2008 de 24 de Julho), a preservação das comunidades naturais existentes, promovendo o seu equilíbrio biológico e paisagístico.

19º
Resulta da conjugação do nº 3 do art. 9º com o Relatório que serviu de base à criação da Paisagem Protegida, que a Zona de Protecção Especial destina-se especialmente a proteger diferentes habitats e espécies, mantendo um nível relativamente baixo de intervenção.

20º
Conclui-se do exposto que, embora não se trate de um espaço de restrições absolutas, apenas devem ser aprovados os projectos que fundamentem o interesse manifesto, que possa contrabalançar o peso ambiental de que se reveste a zona de protecção mencionada.

21º
Ou seja, da articulação destes dados, podemos concluir que se pretendeu aqui dar voz ao princípio da precaução, o qual, funcionando nos casos em que não existem dados científicos que comprovem a existência de riscos com um grau significativo de probabilidade, direcciona a solução jurídica no sentido de, perante extrema relevância do bem ambiental e do potencial dano irreversível que possa vir a ocorrer, dar preferência ao ambiente: in dúbio pro ambiente.

22º
Como resulta do Relatório que serviu de base à criação da PPRM, existe na Ribeira do Magano uma espécie muito rara, a Petinga de Águas Escuras (peixe), de relevante interesse ecológico.

23º
Dada a sua descoberta científica recente, ainda não existem conhecimentos científicos sólidos acerca da possibilidade da sua afectação biológica pela ETAR.

24º
Esta incipiência de dados científicos, conjugada com a raridade desta espécie (existe apenas em algumas águas da região) e da sua impossibilidade de manter a capacidade reprodutora num outro habitat, só pode conduzir, de acordo com o princípio da precaução, à inviabilidade de construção de uma ETAR com a capacidade que está referida no projecto sujeito a aprovação.

25º
Por outro lado, para além da violação do princípio da precaução, deveria ter sido considerado o mau enquadramento da ETAR na paisagem. Como resulta do Acórdão do STA 13-11-2002, Proc. 042343, a existência de uma Área Protegida implica também que as construções tenham que adequar ao meio envolvente: “também decorre que, (...), a pretendida construção prejudicaria o valor estético, ou «cénico», da área”.

NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO, E COM O MUI DOUTO SUPRIMENTO DE V. EXA, DEVE A PRESENTE ACÇÃO SER JULGADA PROCEDENTE POR SE CONSIDERAREM VERIFICADOS OS VÍCIOS ASSINALADOS, EM CONSEQUÊNCIA:
A) Ser anulado o acto administrativo de emissão do alvará nº 13/10, realizado pelo Presidente da Câmara Municipal de Vila Pouca de Alarico.
Para tanto, deve a entidade pública demandada ser citada para, querendo, contestar, seguindo-se os ulteriores termos, até final;
Deve, ainda, ser citado o seguinte contra-interessado:
1) • JOÃO SEBASTIÃO RIBEIRO & FILHOS S.A.

Prova testemunhal:
 Maria Botelho Cardoso, portadora do Bilhete de Identidade nº145879562, emitido pelos SIC de Lisboa a 13/4/2007;
 João Andrade de Oliveira, portador do Bilhete de Identidade nº18125623, emitido pelos SIC de Lisboa a 16/5/2008.
Valor: Indeterminável
Junta: Procuração forense, cópia e duplicados legais e, bem assim, comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida.
A ADVOGADA,
Marisa Ferreira Bastos

Anexos

PROCURAÇÃO FORENSE

A Associação AMIGOS DAS ÁGUAS ESCURAS, pessoa colectiva nº 503.564.536 (representada por Albertina Pinheiro) com sede em Rua das Fontaínhas, Lote 3, 2345-453 Vila Pouca de Alarico, constitui sua bastante procuradora a Dr.ª Marisa Ferreira Bastos, Advogada, titular da Cédula Profissional Nº14523L, a Dr.ª. Ana Repolho, Advogada, Titular da Cédula Profissional Nº 62534L, e a Dr.ª Inês Horta, Advogada, Titular da Cédula Profissional Nº 45236L, advogadas com escritório Rua Dos Mares, nº23,Vila Pouca de Alarico, conferindo todos os poderes forenses gerais, e ainda os especiais, incluindo os de acordar, transigir, confessar ou desistir no âmbito do processo que corre os seus termos.

Assinatura,
Albertina Pinheiro

A Advogada,
Marisa Ferreira Bastos
_____________________________________

ALVARÁ Nº 13/10
Vila Pouca de Alarico, 26 de Março de 2010
Presidente da
Câmara Municipal de Vilar Pouca de Alarico
Emissão de alvará

Cliente Municipal Nº1432

JOÃO SEBASTIÃO RIBEIRO & FILHOS S.A., pessoa colectiva nº 503.658.354, com sede em Av. da Praia nº104, Porto de Galinhas, Brasil,

Vem requerer, nos termos do Artº 76º do Decreto Lei 555/99 de 16 de Dezembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 60/2007 de 4 de Setembro, emissão de alvará para obras de construção e instalação de uma ETAR com capacidade superior a 60.000/eq, a que respeita o processo nº 345.


Autorizo, JOÃO SEBASTIÃO RIBEIRO & FILHOS S.A a levantar o alvará de licença de construção de ETAR.

__________________________________

Comprovativo do pagamento da taxa de justiça (aparece em cima por não termos conseguido colocá-la aqui)
______________



Decreto Regulamentar nº 35/2008
de 26 de Fevereiro


Artigo 1º (Criação)

O presente diploma cria a Paisagem Protegida da Ribeira do Magano.


Artigo 2º (Objectivos)
A Paisagem Protegida da Ribeira do Magano (PPRM) tem como objectivos preservar as comunidades naturais existentes, promovendo o seu equilíbrio biológico e paisagístico.

Artigo 3º (Delimitação geográfica)

Do desvio da estrada florestal na encosta das Esquinas, pela linha de água nascente da Ribeira do Magano, em direcção a jusante até à confluência da barroca de Degrainhos; desta confluência, segundo a inflexão da linha de água em linha recta na direcção E.-W., até ao carreteiro que, partindo da povoação de Visigodo, segue a linha de festo da Lomba do Alarico na direcção N.-S.; pelo referido carreteiro até ao caminho de pé posto que estabelece a ligação entre esse mesmo carreteiro e o ponto de confluência das linhas de água da barroca do Pardal e da barroca do Entrudo; desta última confluência, pela barroca do Entrudo em direcção sul, até ao marco geodésico (Picoto) cota 1018, e do marco geodésico, seguindo a estrada florestal em direcção este, até ao desvio da estrada florestal na encosta das Esquinas.

Artigo 4º (Regulamentação)

Cabe ao Governo regulamentar a criação e gestão da Área de PPRM.

Artigo 5º (Comissão Instaladora)

1. O Governo nomeará uma Comissão Instaladora que deverá integrar um representante de cada uma das seguintes entidades:
a) o Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB);
b) a Junta Metropolitana do Porto;
c) a Câmara Municipal de Vila Pouca de Alarico;
d) as Juntas de Freguesia de Águas Escuras e Águas Claras;
e) o departamento de zoologia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto;
f) a Comissão de Coordenação Regional do Norte;
g) a Direcção Geral de Florestas;
h) associações de conservação da natureza com actividade local.
2. A Comissão Instaladora será presidida pelo representante da Junta Metropolitana do Porto.

Artigo 6º (Competências da Comissão Instaladora)

São competências da Comissão Instaladora:
a) elaborar a proposta de regulamento da área de paisagem protegida, a aprovar pelo Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território;
b) Propor ao Ministério da tutela a alteração dos limites definidos pelo artigo 2º, desde que devidamente fundamentada.

Artigo 7º (Plano de Ordenamento)

1. Tratando-se da protecção de um interesse nacional, a Área de Paisagem Protegida disporá, no prazo máximo de 1 ano após a sua criação, de um plano de ordenamento que definirá a utilização diversificada do território da RM.
2. A elaboração e aprovação deste plano de ordenamento deve ser feito em colaboração com a CCRN, as autarquias locais e as associações locais de natureza ambiental.
3. A aprovação final deste plano de ordenamento terá que ser obrigatoriamente precedida de um período de discussão pública não inferior a 30 dias.

Artigo 8º (Limites)
1. Dentro dos limites da Paisagem Protegida da Ribeira do Magano, ficam sujeitos a uma fundamentação especialmente intensa os licenciamentos ou autorizações camarárias ou outros actos semelhantes previstos na lei, as seguintes actividades:
a) Construção, reconstrução, ampliação ou demolição de edifícios e outras construções de qualquer natureza;
b) Aterros, escavações ou quaisquer alterações à configuração do relevo natural;
c) Derrube de árvores, isoladamente ou em maciço;
d) Abertura de novas vias de comunicação e passagem de linhas telefónicas e eléctricas, condutas de água ou esgotos;
e) Abertura de fossas, depósitos de lixo ou materiais;
f) Instalação de locais de campismo ou acampamento.

Artigo 9º (Zona de Protecção Especial)

1. É criada uma Zona de Protecção Especial.
2. A Zona referida no número anterior compreende a Ribeira do Magano e as suas margens (até 250 metros).
3. Esta Zona contém valores naturais e paisagísticos cujo significado, do ponto de vista da conservação da natureza, se assumem no seu conjunto como relevantes, destinando-se especialmente a proteger diferentes habitats e espécies, mantendo um nível relativamente baixo de intervenção.
4. Na Zona de Protecção Especial, a implementação de projectos que envolvam a instalação de estações de tratamento de águas residuais de capacidade superior a 60 000 hab/eq fica sujeita ao critério da inevitabilidade.
5. O critério da inevitabilidade assenta na imprescindibilidade da infra-estrutura para a satisfação dos interesses da comunidade local.


Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 7 de Fevereiro de 2008.

Mário Cantares-Carlos Alberto Lambreta-António Anjinho-Eduardo Ribeiro Carvalho-Rui Manuel Cardoso-Manuel José Costado- Álvaro Roque de Pinho Bissaio Barreta-António Capuchinho-Carlos Montez Melancia-Alípio Barrosa Pereira Dias.

Promulgado em 26 de Fevereiro de 2008.
Publique-se.
O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHETE ÀGUAS.
Referendado em 8 de Março de 2008.
O Primeiro-Ministro, Mário Cantares.

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